O líder do futuro – como pode a inteligência emocional apoiar o processo de tomada de decisão?

Dimensão analítica: Economia, Trabalho, Governação Pública

Título do artigo: O líder do futuro – como pode a inteligência emocional apoiar o processo de tomada de decisão?

Autora: Bárbara Sepúlveda Maciel

Filiação institucional: Consultora de Recursos Humanos

E-mail: barbara.sepulvedam@gmail.com

Palavras-chave: liderança, tomada de decisão, inteligência emocional.

Até à década de 80, o líder era visto e analisado de forma bidimensional: por um lado, era avaliado pela “consideração” (o líder exibia comportamentos que ajudavam a desenvolver confiança mútua, respeito, preocupação, etc., por parte das equipas), por outro era avaliado e definido pelos comportamentos orientados à tarefa, (capacidade de distribuição de tarefas, a comunicação ou a definição de objectivos). [1]

Dada a preponderância do papel dos líderes na condução de acções e em tomadas de decisão dentro de organizações, os modelos de estudo e definição do que significa a liderança foram sofrendo alterações.

No final do século XX, surge o conceito de liderança autêntica, dentro do ramo de Psicologia Positiva, que retoma o seu surgimento. A liderança autêntica é vista como um “padrão de comportamento do líder que se baseia e promove, tanto as capacidades psicológicas, como um clima ético positivo, com o objectivo de promover uma maior auto consciência e perspectiva moral, um tratamento mais equilibrado da informação e a transparência das relações com os seus subordinados, promovendo o autodesenvolvimento“ [2]. Este constructo está focado na componente moral, de princípios e valores que o líder encerra em si mesmo.

A liderança poderá ainda ser vista como ética, definindo-se como a “demonstração de condutas normativamente apropriadas através de acções pessoais e relações interpessoais da sua promoção, com recurso a comunicação two way, reforço e tomada de decisão” [3].

Neste processo de tomada de decisão vemos várias fases e conjunto de ferramentas das quais se podem servir os decisores, para melhores resultados.

Em 1977, Machline determina um conjunto de 14 fases associadas a todo o processo de tomada de decisões, desde a identificação do problema, até à fase de aprovação final, em que o valor e a utilidade da decisão estariam sempre na base de todo o processo e em cada fase. Define que “o processo de tomada de decisão no indivíduo e na empresa é complexo. Pode enveredar por caminhos muito diversos, desde o impulso repentino, complementado por imposição autocrática, até a análise aprofundada, seguida por laborioso processo de negociação e compromisso”.[4] Autores mais recentes, identificam a tomada de decisão como a escolha entre alternativas apresentadas, com o foco de resolver problemas [5]. Numa perspectiva mais abrangente, este processo prevê que o problema seja reconhecido, que sejam identificadas soluções e que se escolha a solução mais adaptável, resolvendo o problema [6] Acredita-se que existem ferramentas que permitem maximizar a eficiência do resultado final, nomeadamente a inteligência emocional.

Foi com Daniel Goleman, que o conceito de IE ganhou relevo e dimensão, apesar de ter sido abordada pela primeira vez por Salovey e Mayer. De acordo com a visão do Goleman, IE permite ao indivíduo gerir as suas emoções e a de outros. Isto significa ser capaz de reconhecer o que estamos a sentir e o seu significado para aquele contexto, compreendo o seu impacto. No contexto organizacional, este processo ganha importância: a motivação, o controlo de impulsos e busca do melhor nos outros, contribui para que surjam sentimentos e que seja a comunicação, compreensão, empatia, avaliação de contexto e, consequentemente, a tomada de decisão [7]

Através desta ferramenta (IE) aplicada à tomada de decisão, conseguimos uma avaliação mais completa, com diferentes perspectivas, são equacionadas as emoções do grupo, e as do decisor, e a fase de avaliação de informação é enriquecida com uma nova visão: a das emoções. Desta forma, é permitido o desenvolvimento de laços, união e empatia que numa avaliação apenas subjacente à QI não ocorreria. Procura-se que haja uma conjugação equilibrada entre os diferentes tipos de inteligência, conjugando conhecimento técnico e formação (QI) e autocontrolo emocional, consciência emocional, de forma a saber lidar com imprevistos e manter a motivação para resolver problemas, procurando soluções eficientes (IE). [7]

No contexto organizacional, fomos deixando cair pressupostos rígidos sobre o trabalho, a liderança, a gestão do trabalho e a tomada de decisões. À medida que a indústria e tecnologia avançam, vamos percebendo que várias são as novas componentes e esferas da vida que adquirem significado e importância. O homem moderno, cada vez mais, é o que se liga ao trabalho, aos dados, aos números, mas com a capacidade de os inserir no contexto humano, não só organizacional.

Enquanto escrevo este artigo, vivem-se tempos diferentes, e uma pandemia mundial (Covid-19) atravessou-se em todos os mercados, negócios e vidas. À luz de quem vive esta realidade de muito perto, compreendo que os negócios e empresas tiveram lideranças que permitiram uma rápida resposta, em vários sectores, à crise humana que deu origem à crise económica.

As empresas reajustaram competências de colaboradores para os tornarem “úteis” à luz de novas necessidades, caíram formalismos e cada vez mais nos vemos como iguais, quer pela fragilidade que sofremos todos, quer pelo novo contacto que temos de fazer. A comunicação passa a desenvolver-se em casa, nas nossas salas, com os filhos a cantar no quarto ao lado, com os animais a passearem em frente aos ecrãs e, por vezes, com a roupa de passear no parque da cidade.

Para esta geração de líderes e gestores, nunca antes fez tanto sentido a aplicação da IE para dar resposta às exigências de um novo mundo, em que a tecnologia permite quebrar barreiras. Estamos mais próximos, preocupados com a ansiedade que o teletrabalho pode gerar, com o foco em nos mantermos saudáveis e emocionalmente estáveis dentro de casa – de onde não devemos sair – e a luta contra o isolamento social tornou-se um mantra que evidencia o poder da empatia, o poder do controlo emocional e a capacidade de compreender o poder da emoção nos resultados, na eficiência, no trabalho de equipa e até na saúde mental.

A tónica está agora nos traços mais interpessoais do líder, mais do que nas suas capacidades cognitivas de gestão, análise, ou know how técnico, e está a ser a ferramenta mais eficaz para os processos de tomada de decisão nesta gestão de crise.

 

Notas:

[1] Holtz & Harold. 2012 cit. por Mónico, L., Pais, L., Pratas, I. & Santos, N. (2019), Como é o chefe ideal? Um estudo sobre a sua representação social  em portugueses. Revista Psicologia, 33 (1), pp. 1-18

[2] Walumbwa et al., 2008, p.94, cit. por Mónico et. al. (2019).

[3] Bedi, Alpaslan & Green, 2016 cit. cit. por Mónico et. al. (2019).

[4] Machline, C.e (1977), O processo decisório na Gestão de Tecnologia, Revista de Administração de Empresas, 17, pp. 141-158

[5] Sobral & Pecci, 2008 cit. por Leite, E.; Silva, M. & Pontes, P. (2019), O uso da Inteligência Emocional: Como ferramenta de Gestão Pública na Tomada de Decisões, Revista Psicologia & Saberes, 8, pp. 305 – 319

[6] Griffin, 2007 cit. por Leite, Silva, & Pontes, (2019).

[7] cit. por Leite, E.; Silva, M. & Pontes, P. (2019).

.

.

Esta entrada foi publicada em Economia, Trabalho e Governação Pública com as tags , , . ligação permanente.