Para além do crescimento: novas propostas para alcançar o desenvolvimento sustentável

Dimensão analítica: Condições e Estilos de Vida

Título do artigo: Para além do crescimento: novas propostas para alcançar o desenvolvimento sustentável

Autora: Isabel Silva Cruz

Filiação institucional: Instituto de Sociologia – ISFLUP

E-mail: imsilvacruz@gmail.com

Palavras-chave: Crescimento, decrescimento, desenvolvimento sustentável

No contexto actual de crise, cujo fim tem vindo a ser sucessivamente adiado, importa retomar o debate centrado nas questões do crescimento e do decrescimento, já abordado num artigo de Sofia Vaz – “Crescer ou não crescer, eis a questão”, publicado em Abril de 2012, nesta Plataforma.

A opção dos governos e das políticas que estes definem continuam a privilegiar o crescimento económico como o caminho que conduz à “vida boa” e ao bem-estar. Contudo, esta relação tem vindo a ser refutada quer em termos teóricos, quer através de evidências empíricas.

Hoje, é já consensual que o crescimento económico não gera prosperidade nem uma melhor qualidade de vida. Pelo contrário, ele reduz o nível de vida de grande parte da população mundial, agravando as desigualdades sociais. As suas consequências sobre o ambiente são, também, visíveis quer através da degradação dos ecossistemas, quer do aumento das emissões de carbono. A ausência de justiça constitui um dos motivos que fundamentam o questionamento desta fórmula convencional de alcançar a prosperidade. Assim, considera-se que é urgente o desenvolvimento de uma macroeconomia que não assente num crescimento implacável do consumo (Jackson, 2009). No mesmo sentido, questiona-se o Produto Interno Bruto – PIB enquanto indicador que permite medir o nível de bem-estar de um país.

A discussão entre o crescimento e o decrescimento ganhou centralidade através da análise das questões relativas ao desenvolvimento sustentável. Se por um lado é consensual a ideia de impôr limites ao crescimento económico e a necessidade de pôr fim ao crescimento enquanto imperativo, por outro, são diversas as perspectivas do “decrescimento”.

A proposta da indiferença ao crescimento – a-growth, de van den Bergh, consiste em opôr-se ao indicador PIB, em vez de ao crescimento do PIB” (van den Bergh, 2011:885). Esta diferença, simultaneamente, subtil e essencial não é ainda tida em conta quer pelos defensores do crescimento, quer pelos seus opositores. O autor refere que muitos economistas não renunciam à utilização do PIB per capita como indicador de progresso e bem-estar, mesmo concordando que as correlações entre estes ou entre o PIB e o impacto ambiental não são constantes nem estáveis, ao longo do tempo – “paradoxo do PIB” (van den Bergh, 2011:886). Assim, o PIB continua a afectar as decisões em vários níveis da economia e actua como uma barreira sistémica face às políticas na esfera do ambiente, da segurança social, dos mercados de trabalho, da pobreza, da saúde e do lazer. Para ultrapassar este dogma que não é sustentado pela ciência económica, van den Bergh propõe que se incentivem os economistas, os políticos, os mass media e os cidadãos a dar menos importância à evolução do PIB.

Segundo Kallis (2011), o decrescimento corresponde a uma redução socialmente sustentável e equitativa da produtividade da sociedade. Esta redução implica uma redução do PIB devido à dependência do crescimento económico face à energia não renovável e aos materiais (Romolo, 2012). Contudo, o objectivo do decrescimento sustentável não é o decrescimento do PIB. Os defensores desta perspectiva consideram que o decrescimento do PIB corresponde a uma possível manifestação dos limites ecológicos ao crescimento (Kallis et al, 2009), com benefícios ambientais decorrentes da redução das emissões de dióxido de carbono – CO2 (Martinez-Allier, 2009) e como uma janela de oportunidade para mudanças ao nível das políticas e dos comportamentos. No mesmo sentido, e para Latouche (2010), a noção de decrescimento visa assinalar o abandono do modelo de crescimento centrado na procura desenfreada do lucro, com consequências desastrosas para o meio ambiente. O autor propõe que se fale de a-growth, que significa o abandonar de uma religião: a religião da economia, do crescimento, do progresso e do desenvolvimento. Para o autor, o decrescimento não é um conceito mas sim um slogan político com implicações teóricas (Latouche, 2010:519). Assim, cada sociedade, cada cultura deve promover uma identidade baseada na diversidade das suas raízes e tradições e abandonar o podutivismo totalitário. A questão central, para Latouche, é afastarmo-nos da sociedade de destruição que se perpetua sob os conceitos de desenvolvimento e de globalização.

Neste debate não podemos deixar de referir as questões ambientais e as mudanças climáticas. Estas impõem que se pense criteriosamente a eficácia das estratégias de desenvolvimento atendendo, simultaneamente, às características comportamentais e aos limites dos indivíduos e das organizações (van den Bergh, 2011). Neste sentido, a tomada de consciência dos limites ambientais e as consequências trágicas de uma exploração irracional dos recursos são considerados essenciais para o aparecimento de novos modelos de pensamento. Estes desencadearão uma mudança tanto no comportamento dos indivíduos como na estrutura da sociedade (Meadows, 1972; Latouche, 2010).

Nesta abordagem ao desenvolvimento sustentável é preciso não esquecer, também, os condicionalismos do contexto social e cultural na definição e no constrangimento da escolha individual. Assim, autores como Dawkins (2001) sublinham a importância de uma intervenção política para fomentar, apoiar e sustentar comportamentos morais e sociais.

Para terminar deixamos três ideias que nos parecem constituirem novos caminhos para sairmos da crise e para alcançarmos o desenvolvimento sustentável. A primeira ideia enfatiza a necessidade de alertar a sociedade para as políticas públicas e as estratégias com base nos impactos esperados no bem-estar ou na felicidade e não através dos rendimentos. A segunda defende que um futuro com menor rendimento mas maior bem-estar, conduz ao desenvolvimento sustentável. A terceira afirma que é importante acreditar na capacidade colectiva para planear a mudança social.

Referências:

Dawkins, R. (2001). Sustainability doesn’t come naturally: An evolutionary perspective on values. «Values platform for sustainability», Inaugural lecture present at the Environment Foundation, Wednesday, 14 November de 2001, London: The Royal Institution.

Jackson, T. (2009). Industrial ecology in europe: Beyond the growth economy. Journal of Industrial Ecology, 13 (4), 487-490.

Kallis, G. (2011). In defence of degrowth. Ecological Economics. 70, 873-880. www.elsevier.com/locate/ecolecon

Latouche, S. (2010). Degrowth. Journal of Cleaner Production, 18, 519-522. www.elsevier.com/locate/jclepro

L’occhio di Romolo. (2012). Society’s throughput. http://www.locchiodiromolo.it/blog/tag/neoclassical-economics.

Martínez-Alier, J. (2009). Socially sustainable economic degrowth, Development and Change, 40 (6), pp. 1099-1119.

Meadows, D., Randers, J. & Behrens III, W. (1972). Limites do crescimento: Um relatório para o projecto do Clube de Roma sobre o dilema da humanidade. São Paulo: Ed. Perspectiva.

Van den Bergh, J. (2011). Environment versus growth: A criticism of “degrowth” and a plea for “a-growth”. Ecological Economics, 70, 881-890. www.elsevier.com/locate/ecolind

Vaz, S. (2012). “Crescer ou não crescer, eis a questão”. Dimensão  analítica: Condições e Estilos de Vida. Plataforma Barómetro Social. Abril de 2012. http://barometro.com.pt.

 

 

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