Sobre a missão do ensino superior

Dimensão analítica: Educação, Ciência e Tecnologia

Título do artigo: Sobre a missão do ensino superior

Autor: Augusto Santos Silva

Filiação institucional: Faculdade de Economia da Universidade do Porto

E-mail: asilva@fep.up.pt

Palavras-chave: Ensino superior, instituições de ensino, missão.

A missão das instituições do ensino superior é pluridimensional. Isto é claro, quer as especifiquemos por relação à convencional tripartição entre ensino, investigação e prestação de serviços ou ligação ao meio, quer valorizemos especificamente a criação e difusão cultural. Isto é válido para todos os subsistemas, independentemente da forma diferente como ensino público e ensino privado podem ou devem encarar aspetos da sua missão e independentemente das modalizações específicas que precisam a sua definição para as universidades e para os institutos politécnicos.

Vale, contudo, a pena trazer a missão para o coração de um debate estratégico sobre o ensino superior. Por razões elementares de lógica e doutrina: seria canhestra uma discussão sobre o futuro e o que fazer nesse futuro que não partisse de uma clara assunção do que são as identidades e finalidades. Ter uma consciência precisa do que seja a nossa missão é meio caminho andado para construir a nossa visão, o que, por sua vez, representa um passo essencial para estabelecer a estratégia. Mas também por razões de apreciação e exame crítico do que temos feito e do que nos falta fazer, nos dias de hoje, quanto à obrigação de cumprirmos a missão, porque essa é a melhor forma de percebermos potencialidades e bloqueamentos.

Ora, nem sempre se pautam pelo equilíbrio as conceções da inter-relação das várias dimensões constitutivas da missão – ou, para dizer o mesmo noutros termos, das várias funções que compete às instituições do ensino superior assegurar. Dados os elos mais estreitos entre o ensino, a investigação aplicada, a relação com o mundo económico e profissional e a vinculação regional, no ensino politécnico, situa-se porventura nas universidades a manifestação mais notória de alguns desequilíbrios naquelas conceções.

O mais grave, na perspetiva do sistema como tal, rodará em torno do eixo ensino. Ainda vigora em demasia a tradicional desvalorização da função de ensino nas grandes universidades do Estado, a qual se materializa, quer em sede de avaliação do desempenho dos professores e nos critérios e mecanismos de progressão na respetiva carreira, quer na avaliação do desempenho dos estudantes, quer na avaliação da eficiência e do impacto das atividades das instituições. Valorizar o ensino e desenvolver a qualificação pedagógica constituem um desafio que o nosso ensino superior não pode deixar de enfrentar decidida e positivamente. Provavelmente, ele não se ganha apenas, ou sobretudo, no plano dos recursos materiais; ganha-se sim no plano dos recursos humanos e da organização. E, aí, só é possível uma opção: acento tónico na qualidade e na excelência, cultura de exigência, trabalho e rigor, premiação sem rodeios ou subterfúgios do mérito, responsabilização de todos e cada um, docentes ou discentes, lideranças, estruturas de representação ou corpos sectoriais.

Depois, algumas ideias requerem ainda algum trabalho de persuasão junto dos vários interessados. A associação entre investigação e ensino como característica matricial da atividade de um professor universitário é uma delas; e outra a de que a chamada ligação ao meio não é um aspeto menor ou lateral, mas sim um elemento central do serviço público que cada instituição presta e uma condição, se não indispensável, ao menos muito favorável, para o seu desenvolvimento.

A Universidade não é uma ilha social; discentes e docentes não podem estar isentos de um escrutínio rigoroso da atividade que realizam, dos resultados que conseguem e do mérito que revelam; as várias funções que as instituições exercem são essenciais para a sua implantação; os membros têm deveres indeclináveis de contribuição para as respetivas instituições. Numa palavra: só tiraremos benefício de uma atitude claramente orientada para a valorização da relação entre escolas e meio social e para a valorização do profissionalismo, do trabalho e do mérito.

 

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