Dimensão analítica: Cidadania, Desigualdade e Participação Social
Título do artigo: Capital Social das elites parlamentares portuguesas
Autor: Jorge Almeida
Filiação institucional: ISCTE-IUL
E-mail: Jurek@sapo.pt
Palavras-chave: Capital Social, elite parlamentar, associativismo
Numerosos estudos defendem que, em Portugal, a ligação entre eleitor e eleito é ténue e desnecessária para a eleição da maioria dos deputados; estes apenas precisam do apoio dos dirigentes partidários para serem incluídos nas listas. Os eleitores votam nos Partidos ou nos seus principais dirigentes e, nesse processo, elegem muitos deputados anónimos com os quais a sua relação é reduzida ou nula.
Esta tese está em linha com a teoria do Capital Social que prevê que em sociedades com baixos níveis de Capital Social os regimes tendam a ser menos participativos e que cristalizem numa democracia mais formal do que substancial em que a distância entre eleitores e eleitos é elevada e, consequentemente, a confiança nas instituições e nos parlamentares baixa.
Segundo Almeida [1] “A ideia de Capital Social parte da constatação obvia que as nossa relações interpessoais contam, que a forma de nos associarmos, com quem, onde e para quê, tem uma influência decisiva na nossa vida, na vida da nossa comunidade e de forma agregada na nossa sociedade”. O conceito foi inicialmente formulado por Pierre Bourdieu, que via o Capital Social como uma das três formas de capital conjuntamente com o capital cultural e o capital económico. O Capital Social é definido como sendo o conjunto de recursos de uma rede ou de um grupo que um indivíduo pode mobilizar. Numa linha diferente, Coleman desenvolveu outra perspetiva do Capital Social que seria constituído por um conjunto de diferentes estruturas sociais que facilitam a ação dos atores. Putnam [2] conserva um entendimento próximo do de Coleman: “por capital quero dizer, aspetos da vida social – redes, normas e confiança – que permitem aos participantes agir em conjunto para alcançar objetivos comuns”. O associativismo é chave para estabelecer redes, desenvolver normas e criar confiança. Sem associativismo não há Capital Social.
Portugal é um país de baixo Capital Social. O muito citado trabalho de Knack e Keefer [3] envolvendo 29 países mostra que Portugal apresenta valores muito reduzidos de Confiança (26º lugar), de Civismo (26º lugar), de Associativismo (sétimo a contar do fim) e de Confiança no Governo (27º lugar). Estudos mais recentes chegam a conclusões semelhantes. Morales [4] no seu estudo sobre a evolução do associativismo em 18 países europeus mostra Portugal sempre nas últimas posições.
Cada eleição é uma oportunidade de renovação do Parlamento. As eleições legislativas de 2005 (X Legislatura) e de 2009 (XI Legislatura) foram momentos de considerável renovação parlamentar. Em 2005 entraram pela primeira vez na Assembleia da República (AR) 101 deputados, 44% do total de membros da AR. Em 2009 o número de estreantes foi de 79 deputados, mais de 30% do efetivo total.
Na perspetiva de que os deputados não necessitam de proximidade nem de um envolvimento com os eleitores é expectável que a grande maioria dos parlamentares, mesmo os estreantes, exiba níveis baixos de participação associativa.
É o que nos propusemos verificar relativamente a essas duas legislaturas com base nos dados recolhidos pelos investigadores André Freire e José Manuel Leite Viegas e publicados com o livro “Representação Política em Portugal”, nomeadamente na informação contida nas Fichas Biográficas dos Deputados Portugueses 1975-2009.
Por força do Estatuto dos Deputados, cada deputado é obrigado a entregar uma declaração (Ficha Biográfica) que inclui informação sobre a sua participação, em cargos de dirigente de organizações cívicas (recreativas, culturais, religiosas, ambientais e outras) bem como a participação enquanto dirigente de organizações de interesses patronais, sindicais ou profissionais. Assim a informação recolhida no Registo de Interesses restringe-se a cargos dirigentes e não à simples filiação numa associação cívica.
Dividimos os parlamentares em três grupos de acordo com a sua experiência: os estreantes, os experientes, que já tinham servido uma ou duas legislaturas (8 anos) e os veteranos já com três ou mais legislaturas no curriculum.
Para a X Legislatura verificamos que os três grupos de antiguidade são praticamente indistinguíveis. Em todos os grupos a taxa de participação é baixa, com a grande maioria dos deputados, mais de dois terços, a não ter qualquer participação na direção nem de associações cívicas, nem de organizações de interesses O grupo com maior participação é o dos Veteranos com 33,33% e grupo com menor participação é o dos Estreantes com 30,69%. As diferenças entre os três grupos são, pois, mínimas.
Na XI Legislatura o panorama de baixa participação dos deputados agrava-se, sofrendo uma redução superior a 10 pontos percentuais. E o grupo em que a participação associativa mais desce é o dos estreantes.
Analisados os resultados a grande conclusão é que em ambas as legislativas a participação dos deputados na direção de associações cívicas ou em organizações de defesa de interesses é escassa. A esmagadora maioria dos parlamentares não tem qualquer participação dirigente a esse nível. Acresce que da X para a XI legislatura há mesmo um decréscimo do número de deputados participativos.
Estas conclusões confirmam a expectativa de uma baixa participação associativa dos deputados portugueses e indiciam uma preocupante ausência de contacto cívico organizado e sistemático entre eleitores e eleitos.
Notas:
[1] Almeida, Jorge, (2011), Capital Social, Lisboa, Imprensa Nacional Casa da Moeda
[2] Putman, Robert D., (1994), Making Democracy Work, New Jersey, Princeton University Press
[3] Knack, Stephan & Keefer, Philip,(1997), “Does Social Capital have an economic payoff? A cross country investigation” in Quarterly Journal of Economics, Volume 112 Número 4, pp 1251-1288
[4] Morales, Laura, (2010), Changing Patterns of Associational involvement in Europe – very first draft, acedido a 20 de Junho de 2010, http://www.essex.ac.uk/ecpr/events/jointsessions/paperarchive/uppsala/ws8/Morales.pdf







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