Meios complementares de diagnóstico e terapêutica

Dimensão analítica: Saúde

Título do artigo: Meios complementares de diagnóstico e terapêutica

Autor: Daniel Galvoeira

Filiação institucional: Hospital do Espírito Santo de Évora, EPE

E-mail: dgalv@evoracity.net

Palavras-chave: enquadramento legal, procura, desafios

Os meios complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT) desempenham um papel fundamental na actividade clínica, possibilitando ao médico prescrever ao paciente o tratamento mais ajustado em cada momento. A evolução tecnológica verificada nos últimos anos, permite oferecer actualmente um leque alargado de novos meios complementares, suportados na mais sofisticada tecnologia. Existem dois tipos de meios complementares – os de diagnóstico e os de terapêutica.

O sector dos MCDT sempre se pautou por uma elevada diferenciação tecnológica incorporada em cada equipamento, aliado a um software médico cada vez mais avançado, traduzindo-se num constante e elevado custo de investigação e desenvolvimento para a indústria. O investimento necessário à instalação deste tipo de equipamento é bastante elevado, o que tornou necessário a definição de critérios técnicos e clínicos mais apertados para a instalação de alguns destes equipamentos, além de ratios populacionais. A Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/95, de 28 de Junho, estabelece os ratios a que deve obedecer a instalação do equipamento médico pesado, nomeadamente para as áreas de Angiografia Digital, Radioterapia Externa, Braquiterapia, Tomografia de emissão de positrões, Câmaras gama e Radiocirurgia com gamma knife.

A forma mais comum de realização de MCDT é através de prescrição médica. No entanto, assiste sempre ao utente a possibilidade de se auto propor à realização de um determinado exame. Contudo, neste caso, os custos da realização desse exame serão integralmente suportados pelo utente.

Actualmente, centenas de prestadores públicos e privados possibilitam a realização de MCDT, oferecendo ao utente um alargado e diversificado leque de opções, com excelentes tempos de resposta. A realização de MCDT envolve um custo elevado para a entidade responsável pelo pagamento dos cuidados de saúde (SNS, subsistemas de saúde, seguros de saúde ou o próprio utente).

O grande desafio que se coloca nos dias de hoje ao sector dos MCDT, centra-se na necessidade de optimizar a capacidade instalada nos prestadores públicos. A ineficiência que se verifica pode resultar de diversos factores:

1-     Pressão da procura – a prescrição de MCDT sem critérios de necessidade bem identificados e justificados, resulta em realização de exames desnecessários. Na maioria das vezes, ao procurar aumentar a eficiência do prestador, não se actua do lado da procura, mas sim do lado da oferta – reforça-se a capacidade e contratam-se mais recursos;

2-     Inexistência de guidelines (protocolos) terapêuticos – as boas práticas clínicas recomendam a implementação de guidelines terapêuticos para o tratamento de diversas patologias. Estes guidelines permitem definir um padrão de tratamento, traduzindo-se numa uniformização de procedimentos. Como exemplo, se para uma determinada patologia um determinado guideline recomendar a prescrição de um exame de Tomografia Axial Computorizada (TAC), e o clínico prescrever um exame de Ressonância Magnética, só com uma justificação bem fundamentada deverá ser realizada. Assim, evita-se a aplicação de um exame complementar mais diferenciado e com maior consumo de recursos e liberta-se essa capacidade para as situações que necessitam realmente da realização desse exame;

3-     Fraca capacidade de fixação de recursos humanos diferenciados / modelo de remuneração pouco atractivo – um dos grandes desafios que se colocam aos prestadores públicos de MCDT é a fixação de recursos técnicos altamente especializados e diferenciados, em especial nas regiões do interior. Os grandes centros públicos prestadores de MCDT encontram-se instalados nos hospitais do SNS e, como sabemos, os hospitais mais diferenciados encontram-se nas grandes áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, por servirem um grande número de pessoas e, nalguns casos, vocacionados para o ensino e para a investigação. Um hospital do interior, com uma baixa diferenciação, tem actualmente grande dificuldade em contratar um médico. Pelo contrário, nos grandes centros hospitalares e hospitais centrais, por via de uma maior diferenciação, existem mais e melhores equipamentos ao dispor dos profissionais, motivando-os. De igual forma, devido à escassez de profissionais nas áreas dos MCDT, surgem variadas oportunidades de trabalho no sector privado, com ofertas remuneratórias bastante atractivas, e que são uma oportunidade para compensar os baixos salários auferidos por estes profissionais no sector público. Contudo, coloca-se o desafio ao sector público, em plena crise económica e de redução de custos com a saúde, de ponderar o modelo remuneratório dos profissionais médicos, e avaliar a capacidade de introduzir um modelo remuneratório individual e por objectivos, baseado em critérios de diferenciação técnica, que motive os profissionais a realizar mais para ganhar mais;

4-     Inexistência de uma rede de informação robusta que permita a consulta e a requisição de exames entre os centros de saúde / Unidades de Saúde Familiares (USF) e os hospitais / prestadores privados – um determinado utente que realize MCDT numa ida à urgência, caso queira ser depois seguido no seu centro de saúde / USF pelo seu médico de família, tem de levar consigo os exames que realizou. Mas, caso não os possua, o médico de família irá prescrever novos exames, alguns deles repetidos. Desta forma, a existência de uma rede de informação e a possibilidade de partilha dos resultados dos exames realizados pelos utentes, quer tenham sido realizados num determinado laboratório privado ou num hospital público, pelos centros de saúde e até pelos médicos privados (clínicas privadas, hospitais privados), irá permitir uma redução drástica dos MCDT realizados. Tal medida, teria grandes implicações ao nível dos custos do SNS e permitiria optimizar os recursos instalados nos prestadores públicos, reduzindo a necessidade de contratação externa de alguns serviços. Mas os benefícios são mais vastos e podem ter impacto na produtividade e na qualidade de vida dos utentes. Na maioria das vezes, a realização de MCDT implica deslocações (algumas de grandes distâncias) e ausências no trabalho. Reduzindo a realização de MCDT por uma melhoria da partilha de informação, melhora-se os ganhos de eficiência, de produtividade para o país, e de qualidade de vida para o utente.

Deve ser ressalvada a evolução paradoxal que se tem verificado no sector da saúde: por um lado, equipamentos de alta diferenciação técnica, com softwares de última geração, implementação de soluções integradas de gestão (ERP’s) e sistemas de paper free, por outro, fraco / nenhum investimento na rede informática da saúde e limitações na partilha de informação.

Existem diversas oportunidades nesta área que podem e devem ser exploradas, que permitirão optimizar os serviços a disponibilizar ao utente, e ao mesmo tempo proporcionar cuidados de saúde de qualidade a um custo mais reduzido.

 

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