Os Jovens, a Escola e a Sociedade, “aqui e lá” na Europa e “lá e aqui” no Magrebe

Dimensão analítica: Família, Envelhecimento e Ciclos de Vida

Título do artigo: Os Jovens, a Escola e a Sociedade, “aqui e lá” na Europa e “lá e aqui” no Magrebe

Autor: Albino D. Cunha

Filiação institucional: Docente no Instituto Superior de Ciências Socais e Políticas/ Universidade Técnica de Lisboa e Investigador no Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais/Universidade Aberta

E-mail: acunha@iscsp.utl.pt

Palavras-chave: Jovens, Escola, Europa, Magrebe.

As sociedades atuais apresentam-se com duas características que, em aparência, se podem interpretar como opostas mas que, na realidade, se complementam: por um lado, uma maior proximidade cultural e, por outro lado, uma grande diversidade cultural. Do contacto entre culturas podem resultar choques ou encontros embora prevaleçam os primeiros visto que estes têm origem, em grande parte, no facto de existir a tendência para julgar os padrões das outras culturas com base nos padrões da nossa cultura. Tal atitude leva as pessoas a não aceitar ou a aceitar dificilmente esses padrões diferentes dos nossos [1]. Estamos perante o etnocentrismo cultural.

Ora, a escola, como um dos principais agentes de socialização, a par da família, dos meios de comunicação social, de outros grupos sociais (amigos, grupos de referência: clubes desportivos, associações de jovens, etc.), tem nas sociedades atuais um importante papel a desempenhar nomeadamente quando ela própria procura adaptar-se aos efeitos da globalização nos modos de vida e nos valores. Na realidade, as escolas são, hoje em dia, espaços multiculturais. O aumento dos contactos e da interdependência a nível mundial (com as suas repercussões ao nível regional e nacional) transforma a maneira como o mundo se apresenta aos jovens e também altera a maneira como o olham e o seu próprio modo de viver [2]. O acesso aos modelos culturais de todo o mundo possibilita que os jovens construam a sua identidade também com referência a esses novos valores a que têm acesso. Por exemplo, os jovens partilham os gostos musicais e as formas de vestir com muitos jovens de outros países e de outras culturas. Estas breves análises que aqui apresentamos resultam de um trabalho de investigação que temos vindo a desenvolver entre a Europa e o Magrebe, centrando o nosso olhar nos jovens que vivem entre duas margens de um mesmo mar, o Mediterrâneo, feito de unidade e diversidade [3].

A escola, dado o tempo que efetivamente os jovens aí passam, é um meio que lhes vai permitir a aquisição de conhecimentos e o desenvolvimento de competências, indispensáveis nos dias de hoje. Neste processo, para além dos métodos tradicionais pedagógicos da escola, que se vão atualizando, os meios de comunicação de massa como a televisão e os meios tecnológicos de informação e de comunicação como a Internet têm um contributo fundamental. Porque podem ser integrados como forma e fonte de aprendizagem. A escola é um importante espaço de convívio e sociabilidade juvenis, onde colegas e grupos de amigos têm um papel essencial no tomar de atitudes, no defender pontos de vista, em alargar perspetivas de análise e no afirmar de personalidades.

Pelos contextos diferenciados das escolas da Europa e do Magrebe mas confluindo para um mesmo objetivo, ou seja, a educação e formação dos jovens em sociedades marcadas pelo fenómeno da globalização [4], compreendemos que, ao inquirirmos jovens de escolas secundárias públicas de Lisboa, Madrid, Paris, Rabat e Tunes, as suas preocupações, os seus valores e interesses são, em grande parte, próximos (Cf. Gráficos 1, 2 e 3).

Gráfico 1 – As preocupações em relação aos jovens do próprio país (Fonte: Base de dados – QEM.2009/2010)

Gráfico 2 – Os valores mais importantes (Fonte: Base de dados – QEM.2009/2010)

Gráfico 3 – Os principais centros de interesse (Fonte: Base de dados – QEM.2009/2010)

Não obstante os diferentes contextos, é na escola que se verifica uma boa parte da educação do jovem e onde este partilha muitas das suas vivências com os seus pares. Neste sentido, a escola acaba por desempenhar, nos diferentes países e respetivos sistemas educativos, um papel semelhante: o de promover, através dos seus programas escolares e, em particular, através dos professores como agentes educativos privilegiados, a sensibilização e consciencialização para determinados problemas marcantes e comuns da nossa sociedade globalizada aos quais se associam determinados interesses e valores próprios dessa sociedade que identificaríamos com “o humanismo do diverso” [5]. Sabemos que outros agentes educativos como a família e os meios de comunicação de massa intervêm no desenvolvimento pessoal e social do jovem. Mas a sua longa inserção na escola e o seu contacto permanente, partilhado e, por vezes, saudavelmente conflituoso, com os seus pares e os seus professores, permite ao jovem estar mais atento às preocupações e aos desafios que a vida lhe coloca discutindo-os, precisamente com todos podendo, de uma forma ou de outra, confrontá-los e filtrá-los contribuindo para a sua experiência de vida [6].

Para além dos contextos diferenciados, quer em termos socioeconómicos, quer em termos socioculturais, os jovens do lado ocidental da Europa mediterrânica e do lado do Magrebe partilham, afinal, algo em comum. E estão, assim, mais próximos. Quanto aos contextos diferenciados, estes, de certa forma, acabam por convergir em alguns pontos, particularmente, quando vivemos um processo globalizador. Um processo que, procurando não ser tanto uniformizador, mas mais unificador, procura sublinhar o que é diverso [7]. Só assim, esse processo se torna efetivamente globalizador no sentido de um partilhar comum das diferenças e das semelhanças como forma de instituir a diversidade da humanidade [8]. A vida e a atividade do homem inscrevem-se em quadros que oferecem carateres comuns. Nessa perspetiva, há que integrar as experiências sociais mais variadas e mais distintas para alargar os estreitos horizontes em que nos habituamos a nos confinar durante muito tempo seja qual for a cultura [7]. O processo de transformações sociais e políticas, mesmo que muito incerto, que têm marcado desde há dois anos os países do Magrebe apresenta-se como paradigmático. Neste sentido, para Lévi-Strauss [9]:

«Pour connaître et comprendre sa propre culture, il faut apprendre à la regarder du point de vue d’une autre, confronter nos coutumes et nos croyances avec celles d’autres temps et d’autres lieux (…) La civilisation mondiale ne saurait être autre chose que la coalition, à l’échelle mondiale, de cultures préservant chacune son originalité» [10].

Referências bibliográficas e webgráficas

[1] NETO, F. (2008). Estudos de Psicologia Intercultural: Nós e outro. 3ª Edição, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

[2] LOPES, M. e PINTO, A. (1999). Competitividade, Aprendizagens e Soluçoes Pedagógicas, Oeiras: Celta.

[3] CUNHA, A e MALHEIRO, M. (2012). «Jeunes Européens et Maghrébins à ‘l’école de l’interculturel’. Résultats et problèmes d’une recherche comparative», in De la Diversité linguistique aux pratiques interculturelles, Costa-Fernandez, E. et Lescarret, O. (2012), Paris: L’Harmattan, Collection Espaces Interculturels.

CUNHA, A. e FERREIRA, M. M. (2011). «Geographical Education and the Intercultural Perspective of Young People from Europe and the Maghreb» in Demirci, A., Chalmers, L., Arı, Y. e Lidstone, J.  (Eds). (2011). Bridges between Cultures through Geographical Education, Building Proceedings of the IGU-CGE Istanbul Symposium: July 8-10, 2010, Turkey, Istanbul: IGU Commission on Geographical Education, Fatih University, pp. 1-12. Disponível em: http://igucge2010.fatih.edu.tr/IGUCGE_istanbul_symposium.pdf.

CUNHA, A. (2005), O Mediterrâneo: a Juventude, a Europa e o Magrebe, Lisboa: Universidade Técnica de Lisboa, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas.

[4] BUREAU INTERNATIONAL D’ÉDUCATION. (2004). Une Éducation de qualité pour tous les jeunes. Réflexions et contributions issues de la 47e session de la conférence internationale de l’éducation de l’UNESCO, Paris: UNESCO.

[5] ABDALLAH-PRETCEILLE, M. (2005). «Pour un humanisme du divers», VST – Vie sociale et traitements, 2005/3 no 87, p. 34-41.

[6] SANCHES, M. de F. C. (Org.). (2009). A escola como espaço social. Leituras e olhares de professores e alunos, Porto: Porto Editora.

[7] LEVI-STRAUSS, C. (2011). L’anthropologie face aux problèmes du monde moderne, Paris: Editions du Seuil.

AUGÉ, M. (2006). Para que vivemos? Lisboa: 90 Graus Editora.

[8] BIZARRO, R. (Org.). (2006). Como abordar… A escola e a diversidade cultural. Multiculturalismo, interculturalismo e educação, Porto: Areal Editores.

DELORS, J. (Coord.) (1996). Educação, um tesouro a descobrir: Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre a Educação para o século XXI, Porto: Edições ASA.

[9] UNESCO. (2002). Déclaration universelle de l’UNESCO sur la diversité culturelle, Paris: UNESCO, p. 16.

[10] «Para conhecer e compreender a sua própria cultura, é preciso saber olhá-la do ponto vista do outro, confrontar os nossos costumes e as nossas crenças com as de outros tempos e outros lugares (…) A civilização mundial não seria outra coisa senão a coligação, à escala mundial, de culturas preservando cada uma a sua originalidade», Tradução do autor.

 

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