Dimensão analítica: Ambiente, Espaço e Território
Título do artigo: (I)Mobilidade (in)sustentável em destinos turísticos
Autora: Márcia Silva
Filiação institucional: Universidade da Beira Interior, Centro de Estudos Comunicação e Sociedade
E-mail: marciabarbosabsilva@gmail.com
Palavras-chave: turismo, território, mobilidade suave.
A promoção de práticas de mobilidade sustentável e inteligente está no cerne das estratégias para a neutralidade carbónica de diversas cidades europeias. Contudo, a discussão em torno de estratégias e políticas voltadas para a alteração do paradigma de mobilidade vigente tem prestado pouca atenção à mobilidade dos visitantes e turistas, particularmente em áreas turísticas altamente atrativas.
As diferentes decisões de mobilidade tomadas pelos turistas acrescentam pressão adicional à sustentabilidade dos destinos que combinam as atividades diárias dos residentes com a chegada dos turistas [1]. Esta interação implica inevitavelmente impactes ambientais, territoriais e socioculturais negativos, entre os quais o aumento das emissões de CO2, do congestionamento rodoviário, do ruido, da sobrelotação dos transportes e espaços públicos, da insegurança rodoviária e da disputa na utilização do espaço público e transporte entre residentes e turistas. Se tomarmos como exemplo a cidade do Porto, o número crescente de turistas na cidade tornou os percursos habitualmente realizados pelos residentes mais demorados. A presença da atividade turística aumentou as dificuldades associadas à circulação nos passeios, nos transportes públicos e nas ruas com implicações no quotidiano dos residentes [2].
De acordo com a Estratégia de Turismo para a década 2017-2027 [3], apesar do transporte ser a principal fonte de emissões de gases de efeito de estufa, a única meta de sustentabilidade presente no documento visa assegurar que mais de 90% das empresas do turismo adotam medidas de utilização eficiente de energia e de água e desenvolvem ações de gestão ambiental dos resíduos. Em relação à mobilidade, inserida no eixo de atuação redes e conectividade, a Estratégia aponta um conjunto variado de medidas, entre as quais: promover e reforçar rotas aéreas ao longo do ano; melhorar os sistemas de mobilidade rodoferroviária; promover a mobilidade sustentável com o objetivo de melhorar as condições de visitação e usufruto da cidade; assegurar boas condições de mobilidade rodoviária nos destinos turísticos, particularmente naqueles em que se registam maior tráfego e intensidade turística; desenvolver projetos que promovam a mobilidade sustentável, nomeadamente a mobilidade suave e a concretização do projeto piloto Algarve-Mobilidade Elétrica, com alargamento a outras regiões do país.
À semelhança do que nos sugerem Gühnemann, et al. [4], a redução das emissões de gases de efeito de estufa relacionados com viagens na atividade turística não pode assentar apenas em veículos elétricos ou soluções tecnológicas, mas numa mudança em relação ao uso dos transportes, nomeadamente através da substituição do transporte aéreo e rodoviário privado pelo transporte ferroviário e público. Para tal, torna-se premente, entre outras medidas, ligações rápidas e diretas entre comboios e autocarros, a aposta em mercados de curta distância, a promoção de estadias mais longas e campanhas de sensibilização juntos dos turistas e decisores [4]. Para além disso, a promoção de soluções verdes de transporte turístico deve estar no centro das estratégias que visam a implementação de destinos turísticos sustentáveis [5]. A multimodalidade, bem como a opção por transportes mais sustentáveis, são entendidos como fundamentais para aumentar a atratividade dos destinos turísticos nomeadamente em relação à sua capacidade de diferenciação entre destinos [6].
No entanto, isso não é possível apenas com políticas locais assentes nas implicações positivas e negativas de cada modo de transporte [7], mas também requer o diagnóstico do perfil do turista e das características da sua estadia. E, na verdade, os destinos turísticos sabem muito pouco sobre os fatores que determinam as escolhas do meio de transporte no seu local de destino. Entre os principais fatores que interferem na tomada de decisão em relação às práticas de mobilidade destacam-se as práticas de mobilidade habituais do turista, a disponibilidade de um sistema de transporte sustentável eficiente no destino, o tempo e custo da viagem, a composição do grupo da viagem (sozinho ou acompanhado), o motivo da viagem, o nível de condicionamento físico do turista, as opções de mobilidade no destino e o clima [5] [7] [8].
De todo modo, o que está em causa é a necessidade de diagnosticar e planear a mobilidade turística com base em dados e conhecimento atualizado sobre o perfil do turista, as suas práticas e motivações, com vista a detetar padrões e avançar com políticas de intervenção nas áreas turísticas em relação ao meio de transporte utilizado nos locais de destino.
Notas
[1] Miravet, D., Dom, A., & Guti, A. (2021). What prompts tourists to become public transportation users at their destination ? The case of a Mediterranean city, Travel Behaviour and Society, 24, 10–21.
[2] Silva, M. (2022). A cidade r(v)endida ao turismo: uma análise aos processos de turistificação do Porto. Universidade do Minho.
[3] Turismo de Portugal (2017). Estratégia 2027, Disponível em http://estrategia.turismodeportugal.pt/sites/default/files/Estrategia_Turismo_Portugal_ET2027.pdf [Consult. 9 abril 2021].
[4] Gühnemann, A., Kurzweil, A., & Mailer, M. (2021). Tourism mobility and climate change – A review of the situation in Austria. Journal of Outdoor Recreation and Tourism, 34, 100382.
[5] Zamparini, L., Domènech, A., Miravet, D., & Gutiérrez, A. (2022). Green mobility at home, green mobility at tourism destinations: A cross-country study of transport modal choices of educated young adults, Journal of Transport Geography, 103, 103412.
[6] Maltese, I. & Zamparini, L. (2022). Sustainable mobility choices at home and within destinations: A survey of young Italian tourists, Research in Transportation Business & Managment, 100906.
[7] Domènech, A., Miravet, D., & Gutiérrez, A. (2022). Tourists’ transport modal choices in Barcelona, Research Transportation Business and Manament, 48, 100902.
[8] Bursa, B., Mailer, M., & Axhausen, K. (2022). Travel behavior on vacation: transport mode choice of tourists at destinations, Transportation Research Part A: Policy and Practice, 166, 234–261.
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