A aprendizagem socioemocional em contexto escolar: alguns desafios e oportunidades

Dimensão analítica: Cidadania, Desigualdade e Participação social

Título do artigo: A aprendizagem socioemocional em contexto escolar: alguns desafios e oportunidades

Autora: Dulce Cunha, Gracinda Monteiro, Joana Oliveira

Filiação institucional: Agrupamento de Escolas À Beira Douro

E-mail: joanateixeiraoliveira@abeiradouro.net

Palavras-chave: Aprendizagem socioemocional, educação integral do aluno, desafios.

A aprendizagem socioemocional, enquanto processo de desenvolvimento de competências sociais e emocionais ao longo da vida, envolvendo conhecimentos, atitudes e competências que permitem escolhas coerentes consigo próprio/a, relações interpessoais gratificantes e um comportamento socialmente responsável e ético [1], tem vindo a ganhar expressão no contexto educativo. A par disto, é inquestionável a ligação entre os processos afetivos e cognitivos [2] e a educação integral dos/as alunos/as como a finalidade última do sistema educativo [3][4]. É neste sentido que apontam os atuais referenciais normativos do sistema educativo português: o Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória e a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania. Contudo, a integração da promoção das competências socioemocionais em contexto escolar é recente e repleta de oportunidades e desafios, acerca dos quais precisamos refletir, para que a mesma se concretize de forma efetiva e eficaz.

À aprendizagem socioemocional em contexto escolar (ASE) é atribuído um valor menor, por oposição à valorização acrescida das competências académicas, apesar da evidência científica atual apontar para o impacto destas na melhoria do desempenho académico e das atitudes e comportamentos dos alunos [1][5]. Os estudos evidenciam ainda que o investimento financeiro na ASE produz o retorno de 11 para 1 e o seu impacto abarca não só os/as alunos/as que beneficiam destes programas, mas também os adultos e a comunidade escolar [6]. Destaca-se a importância da ASE na prevenção de comportamentos de risco, na promoção da saúde mental, no sucesso pessoal e profissional e no atenuar das desigualdades sociais. Todavia, a ASE jamais poderá ser encarada como panaceia para todos os males, uma vez que não resolve, por si só, os problemas existentes no contexto educativo, especialmente se estes tiverem por base situações de origem psicopatológica já instaladas.  A experiência de implementação de programas de ASE [7] revela-nos que, em função dos programas implementados, determinadas condições psicopatológicas podem não beneficiar dos mesmos.

A inclusão das competências socioemocionais nos projetos educativos de cada escola ou agrupamento, numa perspetiva sistémica, envolvendo os diferentes atores do contexto escolar, as suas famílias e a comunidade envolvente, inclusive as autarquias locais, permite a criação de relações de proximidade e a partilha de responsabilidades, maximizando o impacto dos programas implementados [8]. A implementação destes programas ganha maior relevância e impacto, quando se assume como um eixo estruturante do projeto educativo, cuja concretização depende de todos, transformando-se num elemento diferenciador, capaz de promover lideranças endógenas [9].

Tal como as demais competências, as socioemocionais podem ser ensinadas, aprendidas e treinadas. Contudo, esta aprendizagem não pode sustentar-se em intervenções pontuais e avulsas, que ocorrem amiúde no contexto escolar. É imprescindível que cada escola adote programas de ASE já monitorizados e considerados eficazes em contexto escolar [13]. Os programas eficazes, validados cientificamente, assentam em práticas Sequenciais, Ativas, Focadas e Explícitas – SAFE, ou seja, incluem um conjunto de atividades interligadas numa sequência lógica, com formas ativas de aprendizagem que permitem o desenvolvimento de competências sociais e emocionais específicas, claramente identificadas, ensinadas e praticadas [10].

É igualmente desejável que a sua promoção assente numa abordagem integrada, ao longo dos diferentes níveis de ensino, garantindo uma intervenção precoce e longitudinal e o desenvolvimento gradual e ajustado a cada faixa etária, das respectivas competências [8]. Assim, emerge a necessidade da articulação entre os diferentes ciclos, de modo a evitar a repetição ou a sobreposição dos programas implementados. É um trabalho exigente que beneficia da intervenção de uma equipa multidisciplinar em articulação com os diretores de turma e/ou as equipas educativas, para analisar e propor a implementação de programas ASE, em função da especificidade de cada contexto escolar.

A formação dos educadores é indispensável para assegurar uma implementação de elevada qualidade, através de atividades experienciais e com forte componente interativa. Ressalte-se que, em muitas situações, a implementação desses programas fica a cargo dos docentes que necessitam de orientação e apoio de profissionais devidamente qualificados, nomeadamente os psicólogos escolares, muitas vezes assoberbados com um elevado número de acompanhamentos individuais de alunos em situação de crise [11]. Outros profissionais de ação socioeducativa, da qual são exemplo os Educadores Sociais, podem assumir um papel determinante pois detêm capacidades de dinamização de grupos e co-construção de projetos tendo por base o desenvolvimento integral dos alunos, visando a sua participação e autonomia [12].

Desta forma, reafirmamos a centralidade da escola na formação integral do aluno, na sua relação com os outros e com o mundo que o rodeia, e a necessidade da sua reconfiguração e transformação para fazer face ao desafio de se constituir como uma escola humanizada, que educa para a construção de uma vida com sentido e significado.

Notas:

[1] Saúde Mental em Saúde Escolar. Manual para a Promoção de Aprendizagens Socioemocionais em Meio Escolar. Lisboa, 2019.

[2] Rato, J. (2023). Mente, Cérebro e Educação. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos.

[3] UNESCO (2015). Educação para a cidadania global: preparando alunos para os desafios do século XXI. Brasília

[4] OECD (2019). Future of Education and Skills 2030. Learning Compass 2030. OECD Publishing.

[5] OECD (2021). Inquérito às Competências Sociais e emocionais (SSES): Sintra (Portugal).OECD Publishing.

[6] https://casel.org/fundamentals-of-sel/what-does-the-research-say/

[7] As autoras encontram-se envolvidas na implementação de programas ASE no Agrupamento de Escolas À Beira Douro, no exercício das suas funções enquanto Psicóloga escolar, Educadora Social e docente.

[8] https://escolasaudavelmente.pt/

[9] IPAV (2021). Jornadas Científicas. Academia de Líderes Ubuntu. Estudos em Desenvolvimento (documento não publicado).

[10] Greenberg, M.T. (2023). Evidence for Social and Emotional Learning in Schools. Learning Policy Institute.

[11] Pinto, A. M. & Raimundo, R. (2016). Avaliação e Promoção de Competências Socioemocionais em Portugal. Lisboa: Coisas de Ler.

[12] Valente, S. (2020). Competências socioemocionais na atividade do educador social: implicações à inclusão escolar. Revista Ibero-Americana De Estudos Em Educação, 15(3), 2332–2349.

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