Dimensão analítica: Ambiente, Espaço e Território
Título do artigo: Envelhecimento saudável no meio urbano: será que estamos preparados?
Autora: Cláudia Jardim Santos
Filiação institucional: EPIUnit-Instituto de Saúde Pública, Universidade do Porto; Laboratório para a Investigação Integrativa e Translacional em Saúde Populacional (ITR).
E-mail: claudiasantos@ispup.up.pt
Palavras-chave: saúde urbana, geografia da saúde, envelhecimento populacional.
Segundo os censos de 2021, existem 2.423.639 pessoas com 65 ou mais anos em Portugal, representando cerca de 23,4% da população residente no nosso país. A título de exemplo, no Porto, em 2021, aproximadamente um quarto da população residente tinha 65 ou mais anos. O Porto é o quarto município do país com mais população idosa (60.210), apenas superado por Lisboa (127.768), Sintra (68.885) e Vila Nova de Gaia (65.010). Na Cidade Invicta, o número de idosos tem sido crescente. Nas últimas décadas registou-se um incremento de cerca de 8,0%, de 2001 para 2011, e de 9,3%, de 2011 para 2021 [1]. De facto, nesta cidade nortenha por cada jovem existem aproximadamente 2,3 idosos. No espaço de uma década, ocorreu um aumento de 17,4% no índice de envelhecimento, evidenciando a diminuição da camada mais jovem da população portuense em relação às camadas mais envelhecidas [2].
Além disso, após os 65 anos de idade, é esperado que uma pessoa viva mais 17 anos, sendo que as projeções indicam que este número deverá aumentar para 19 anos no período de 2045-2050 [3]. Porém, apesar das populações estarem a ganhar mais anos de vida, não estão, forçosamente, a vivê-los com saúde.
Quando comparamos os aumentos nos ganhos de vida a nível mundial, verificamos que, de 2000 a 2019, a esperança de vida aumentou de 66,8 anos para 73,3 anos, ao passo que a esperança de vida saudável aumentou de 58,3 anos para 63,7 anos [4]. Isto significa que mais anos foram somados à esperança de vida do que à esperança de vida saudável. Assim sendo, é necessário que haja uma maior aposta em intervenções que permitam às populações alcançar um envelhecimento saudável.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o envelhecimento saudável é “o processo de desenvolvimento e manutenção da capacidade funcional que permite o bem-estar em idade avançada”. Por outras palavras, pressupõe que as pessoas sejam capazes de atender às suas necessidades básicas; de continuar a aprender, crescer e tomar decisões; de se movimentar; construir e manter os seus relacionamentos; e de contribuir para a sociedade [5].
Contudo, nem todas as pessoas envelhecem de forma idêntica. Existem diferentes fatores que afetam a maneira como envelhecemos. As características pessoais (tais como o sexo ou a etnia), a herança genética, juntamente com outras características modificáveis ao longo da vida, como os comportamentos de saúde, o acesso aos cuidados de saúde e o local onde vivemos, afetam a forma como envelhecemos [5].
Existe evidência científica que associa os locais onde vivemos à nossa saúde. Por exemplo, as características sociais e físicas do ambiente residencial estão relacionadas com a mortalidade, os comportamentos de saúde, violência, saúde mental, entre outros indicadores de saúde [6]. É importante ressalvar que as pessoas mais idosas estão, normalmente, condicionadas aos espaços mais próximos do seu domicílio, não só devido a questões físicas e emocionais, mas também financeiras, passando mais tempo nas suas áreas de residência [7]. Visto que mais de metade da população mundial com 65 ou mais anos vive em contextos urbanos, é crucial reconhecer como é que estes locais podem ser estruturados de modo a promoverem um envelhecimento saudável [8].
De acordo com a OMS, são essenciais oito atributos para que o envelhecimento na cidade beneficie o potencial dos idosos. Estes estão interligados entre si e, quando adaptados às necessidades dos mais velhos, ajudam ao desenvolvimento de cidades amigas das pessoas idosas. Os atributos essenciais do ambiente físico incluem: espaços exteriores apelativos e edifícios funcionais, um sistema de transportes prático e a existência de habitação adequada. Já os atributos do ambiente social incluem: a participação e o apoio social dos idosos, o respeito e a sua inclusão social, e a participação cívica e o emprego. Por fim, o acesso a informação pertinente nos formatos apropriados, tal como o apoio comunitário e serviços de saúde ajudam na manutenção da saúde e da independência dos idosos na comunidade [9].
Posto isto, importa questionar se as nossas cidades contemplam os tópicos identificados pela OMS e se estamos preparados para otimizar as oportunidades de saúde no ambiente urbano. A verdade é que nem sempre as cidades capacitam os seus habitantes para prosperarem, o que pode influenciar negativamente o envelhecimento saudável. Além disso, os processos de gentrificação urbana que têm ocorrido, atualmente, em várias cidades do mundo, incluindo Lisboa e Porto, transformam o ambiente físico e socioeconómico, tendo potencial impacto na saúde dos seus residentes [10].
Em suma, nos tempos que correm, é da maior importância que haja uma maior aposta em cidades amigas dos idosos, visto que temos uma população cada vez mais envelhecida, com maior longevidade e que vive, essencialmente, em contextos urbanos, como observado em Portugal.
.
Notas:
[1] Pordata (2023). População residente segundo os Censos: total e por grandes grupos etários. [Consult. 17 março 2023]; Available from: https://www.pordata.pt/municipios/populacao+residente+segundo+os+censos+total+e+por+grandes+grupos+etarios-22-107.
[2] Pordata (2023). Índice de envelhecimento e outros indicadores de envelhecimento segundo os Censos. [Consult. 17 março 2023]; Available from: https://www.pordata.pt/municipios/indice+de+envelhecimento+e+outros+indicadores+de+envelhecimento+segundo+os+censos-1055.
[3] United Nations – Department of Economic and Social Affairs Population Division (2020). World Population Ageing 2019.
[4] World Health Organization (2021). World health statistics 2021: monitoring health for the SDGs, sustainable development goals. Geneva: World Health Organization.
[5] World Health Organization (2015). World report on ageing and health. Geneva: World Health Organization.
[6] Cubbin, C., et al. (2008). Where We Live Matters for Our Health: Neighborhoods and Health.
[7] Alidoust, S. & Bosman, C. (2015). Planning for an ageing population: links between social health, neighbourhood environment and the elderly. Australian Planner, 52(3): 177-186.
[8] HelpAge International (2016). Ageing and the city: making urban spaces work for older people.
[9] World Health Organization (2007). Global age-friendly cities: a guide. World Health Organization: Geneva.
[10] Smith, G.S., et al. (2020). Impacts of Gentrification on Health in the US: a Systematic Review of the Literature. J Urban Health, 97(6): p. 845-856.
.
.