O que se passa com o cinema em Portugal?

Dimensão analítica: Cultura, Artes e Públicos

Título do artigo: O que se passa com o cinema em Portugal?

Autor: Pedro Saraiva

Filiação institucional: Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra/Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra

E-mail: pdgs@outlook.pt

Palavras-chave: Baixa Fluência, Cinema, Portugal.

O cinema, também conhecido por “sétima arte”, é uma das artes mais conhecidas e referenciadas quando se fala em “Cultura e Arte” ou “Práticas Culturais”. Quando se fala em cinema, pensa-se de imediato em filmes, nas salas de cinema, nos prémios Óscares, no consumo de pipocas, mas também nos atores e atrizes que mais se destacam ou destacaram em filmes previamente visualizados e que marcaram mais os espectadores. Há por isso, uma panóplia de imagens que os espectadores têm quando se fala de “cinema”.

No entanto, a palavra aqui usada para referir as pessoas que veem um filme, “espectadores”, é sobretudo usada para referir as pessoas que se deslocam de suas casas até uma sala de cinema, em que pagam um bilhete para visualizar um filme que será emitido nessa sala de cinema a determinada hora e a determinado dia, havendo inclusive outras sessões, com outras horas e outros dias disponíveis para visualizar esse mesmo filme. Ora, praticamente todas as pessoas adoram ir ao cinema ver o novo filme que estreou, por causa de vários motivos: realizador do filme, continuação de uma saga que estão a acompanhar, entrada no filme de um ator que gostam, entre outros.

Contudo, e se esta lógica for transformada? Ou seja, não ser necessário passar pelos constrangimentos de sair de casa para ir até determinado local para ver um filme, em dias e horas pré-estabelecidas? E se fosse possível visualizar filmes no conforto doméstico, sem ter que pagar bilhete para o ver? Mas, também é sabido que a fluência ao cinema é extramente baixa, exceto em estreias de filmes chamados “blockbusters”. O que pode explicar esta baixa fluência? Alguns fatores podem ser apontados, mas não serão todos e carecem sempre de comprovação científica.

Um primeiro fator que se poderá apontar prende-se com as salas de cinema que estão disponíveis em Portugal. A par das salas de cinema, mais tradicionais e mais regionais, que se encontravam em alguns bairros das cidades, surgiram igualmente as salas de cinema em centros comerciais, dominadas por grandes grupos económicos, agregando muito do cinema que hoje é exibido em Portugal. Muitas destas salas mais locais, não conseguindo competir com estas salas mais recentes acabam por fechar, concentrando a ida ao cinema, apenas nos centros urbanos, onde nem todos podem aceder.

Com este domínio, temos outra situação relacionada: estas salas de cinema praticamente só exibem cinema norte-americano, deixando muito do cinema europeu de fora. Para todos os amantes do cinema europeu, torna-se um desincentivo na sua ida ao cinema. Além disso, aponta-se o preço elevado dos bilhetes. Atualmente, um bilhete de cinema custa entre os 6 e os 7 euros. Com estes preços elevados e com uma seleção limitada de filmes disponíveis, os consumidores não se sentem incentivados a ir ao cinema. Além disso, o facto de uma grande percentagem das salas de cinema em Portugal pertencerem a grandes grupos económicos, (nomeadamente à NOS), não tendo por isso uma grande concorrência, permite-lhes praticar o preço por bilhete de cinema que entenderem, estando livres para irem aumentando estes preços. Também é preciso ter presente que Portugal sofreu uma intervenção financeira, que culminou em cortes no orçamento mensal das pessoas, tornando-se as idas ao cinema mais difíceis. Acrescenta-se também que, uma grande parte da Sociedade Portuguesa ainda não recuperou totalmente os salários anteriores à intervenção financeira, tornando-se difícil o retomar das idas ao cinema, para quem já tinha esse hábito.

Todavia, existem dois fatores que são impossíveis de passarem despercebidos e que poderão explicar em grande parte, a discussão que está a ser feita: acesso fácil e gratuito de websites de partilha de filmes para streaming e download e o acesso a canais de cinema, através de serviços de televisão por subscrição, comercializados por operadoras de telecomunicações.

No caso de Portugal, é claríssimo que o acesso à internet é quase universal, chegando praticamente a todo o país, com grande percentagem da população portuguesa a aceder com regularidade à internet. Associado a este acesso, também a existência de pirataria online é uma realidade que não está imune a ninguém. Basta uma pequena pesquisa em qualquer motor de busca e aparecem milhares (senão mesmo milhões) de websites de partilha de ficheiros, seja de música, a livros, a jornais, revistas e sem exceção de filmes, tanto de cinema norte-americano, como cinema europeu ou mesmo cinema indiano, com as grandes produções de Bollywood a estarem também presentes nestes websites. Além de ser fácil aceder a estes locais de partilha, estes ficheiros estão disponíveis para download ou para streaming de forma gratuita, sem ter que pagar mais por isso, tirando mesmo o próprio acesso à internet.

Podemos também acrescentar o acesso a canais de cinema, disponibilizados pelos serviços de televisão por subscrição. Para aceder a eles, é necessário subscrever a um dos serviços de televisão disponível no mercado, pagando uma mensalidade por esse serviço. Contudo, tendo esse serviço subscrito é possível aceder a um conjunto vasto de canais especializados na transmissão de filmes (também aqui dominados pela grande máquina de produção e distribuição, que é o cinema norte-americano), podendo mesmo ser gravados nas boxes disponibilizados pelas operadoras, para o espetador ver os filmes que quiser, quando quiser e com quem quiser. Pode-se mesmo acrescentar os videoclubes que estas operadoras disponibilizam, no qual os seus clientes podem escolher filmes que estrearam nos cinemas recentemente e que se encontram disponíveis para aluguer por preços baixos.

São vários os fatores que influenciam as idas ao cinema. Entre os fatores que acima se apontam, é importante destacar o acesso à internet e o fácil e gratuito acesso a filmes, de forma ilegal, que leva a um desinteresse nas idas ao cinema, restringindo estas a valores quase nulos. Além disso, os canais de cinema, disponíveis nas televisões, através de subscrição de serviços, assim como os próprios videoclubes que estão disponíveis para os seus subscritores, permite ver filmes que estrearam recentemente nas salas de cinema, mas no conforto das suas casas.

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